Recém aprovado no 34º Exame de Ordem Unificado da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Sérgio Pereira, 36 anos, natural de Imperatriz, no Maranhão, alcançou o feito com determinação e empenho. Até chegar à posição atual como advogado, ele enfrentou situação de rua e fome, tendo que se alimentar com restos de alimentos que garimpava em lixeiras de Fortaleza. Depois de se ver obrigado a abandonar os estudos, e retornando aos bancos de escola quase 20 anos depois, ele alcançou a realização pessoal que tanto procurava.
Antes de se tornar advogado, Pereira trabalhou em “bicos” diversos, como lavador de carro, entregador e chapeiro de lanchonetes. O maranhense conta que além da vontade de conquistar uma vida digna, o desejo de seguir na área jurídica veio acompanhado de momentos desagradáveis, que não estavam em seus planos. Ele lembra um episódio injusto e de discriminação que sofreu. “Estava em um supermercado quando dois seguranças me abordaram achando que eu estava roubando. Eles me levaram para o banheiro, e, mesmo depois de mostrar a nota fiscal da compra, me intimidaram e me mandaram tirar a roupa“, recorda.
Depois da humilhação e do constrangimento, Pereira decidiu registrar um boletim de ocorrência em uma delegacia, mas foi surpreendido com a informação de que a polícia não poderia fazer nada pela simples falta de agentes. Foi este principal motivo que o levou a voltar a estudar, aos 30 anos, concluindo o ensino regular em 2018 por meio do Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja).
Com o dinheiro que conseguiu economizar trabalhando como entregador, Pereira começou a pagar uma faculdade particular de direito. “Trabalhava dia e noite, em dois empregos. Deixei depois o turno da noite e passei a estudar nesse horário”, lembra.
Desafios na faculdade
Mas as dificuldades na vida de Ramos não acabaram depois dele ingressar na faculdade. Além de conciliar os estudos e o trabalho, ele enfrentou toda sorte de preconceito dos colegas de turma, em um ambiente de desigualdade social. “Cheguei perdido na faculdade. Não tinha bagagem e conhecimento dos colegas. Logo notei que teria que me esforçar, estudar muito mais do que eles”, diz.
Ainda estudante de direito, Pereira fez o exame da OAB no 9º semestre, sendo aprovado na primeira tentativa. Para estudar e se preparar para o exame, ele baixava arquivos de provas anteriores e respondia sempre quando tinha tempo. “Cheguei a resolver as treze últimas provas da OAB. Consegui 51 pontos, 11 a mais do que o necessário para ser aprovado”, afirmou. “Veio, então, o sentimento é de conquista, de que tudo valeu a pena.”
Pereira conta, ainda, que além de estudar provas anteriores, “devorava” todas as indicações de leitura dos professores, procurava assistir vídeos no YouTube, baixava as aulas e ouvia as lições no fone de ouvido durante as entregas. “Chegava mais cedo no trabalho e estudava por lá mesmo. De noite, quando saía, ia direto para a faculdade. Colava anotações em todos os lugares da casa. Minhas notas eram baixas no início, mas não reprovei nem uma única vez. Com o passar do tempo, meu rendimento e minhas notas foram aumentando”, disse.
Sérgio recorda também que em determinados momentos do curso sofreu constrangimento e discriminação racial de colegas de turma policiais e passou por diversos momentos em que foi menosprezado pelo baixo vocabulário. “Soube que alguns estudantes que eram policiais puxaram minha ficha para verificar se eu tinha alguma passagem pela polícia. Durante a apresentação de um trabalho fui desprezado e corrigido em voz alta por outros alunos da turma pelo fato de escrever e falar errado”, relata, frisando que esse episódio foi decisivo para investir tempo em se aprofundar na língua portuguesa.
Próximo ao fim do curso, o estudante passou a se dedicar ao estágio. Atualmente no 10º semestre, Pereira trabalha no escritório de advocacia do procurador-geral do Ceará, no mesmo local onde, por várias vezes, entregou comida. “Meu chefe sempre me elogiou e demonstrou plena confiança no meu trabalho, além de me enxergar com admiração”, conta. Mesmo estagiando e já próximo ao fim do curso, Ramos manteve o trabalho como entregador aos sábados e domingos para complementar a renda.
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